Homem de 46 anos, sem antecedentes patológicos relevantes, é referenciado por quadro de epigastralgias, perda ponderal e hipoalbuminema. A endoscopia digestiva alta identificou pregas gigantes/hipertróficas no corpo e fundo (fig. 1) bem como múltiplos pólipos com erosão central no antro (fig. 2).
Figuras 1 e 2: Imagens da endoscopia digestiva alta
As biopsias endoscópicas efectuadas da mucosa do corpo e antro revelaram gastrite crónica, não associada à presença de Helicobacter pylori.
Foi realizada ecoendoscopia, que demonstrou a existência de marcado espessamento da camada mucosa, com múltiplas áreas anecóicas, indicativas de cistos parietais na camada mucosa e submucosa (fig. 3 e 4).
Figuras 3 e 4– Imagens da ecoendoscopia
Seguidamente, procedeu-se à realização de macrobiopsias das lesões do corpo e antro, tendo a análise histológica revelado alongamento do epitélio foveolar, com hiperplasia e dilatação cística das glândulas foveolares na porção basal da mucosa, com extensão para a submucosa (fig. 5).
Figura 5 – Histologia (macrobiopsias das lesões do corpo e antro): alongamento do epitélio foveolar, com hiperplasia e dilatação cística das glândulas foveolares na porção basal da mucosa, com extensão para a submucosa.
Não se identificou displasia e o estudo imunocitoquímico para CMV e Helicobacter pylori foi negativo. Estes achados são sugestivos de Doença de Menétrier coexistindo com Gastrite Cística Profunda. Após discussão com o doente do risco acrescido de carcinoma gástrico e das opções de tratamento disponíveis foi decidido iniciar terapêutica com inibidor da bomba de protões.
Comentários: A doença de Mênêtrier é uma gastropatia hipertrófica idiopática rara, caracterizada por hiperplasia das células foveolares, resultando geralmente no espessamento das pregas do fundo e corpo e hipoalbuminemia. A Gastrite Cística Profunda é uma entidade caracterizada pela proliferação submucosa difusa das glândulas gástricas, desenvolvendo-se sobretudo em indivíduos submetidos a gastroenterostomia. Os dados existentes na literatura, derivados sobretudo de case reports e séries retrospectivas, parecem indicar que, quer a Doença de Menétrier quer a Gastrite Cística Profunda, aumentam o risco de neoplasia gástrica, podendo este efeito ser aditivo, caso as duas condições existam em simultâneo. A melhor estratégia terapêutica para Doença de Menétrier, particularmente se associada a Gastrite Cística Profunda, permanece controversa. As opções incluem o teste e tratamento de agentes infecciosos como o Helicobacter pylori e o CMV, terapêutica anti-secretora com inibidores da bomba de protões ou antagonistas dos receptores da histamina-2, octreotídeo, anticorpos monoclonais para o EGFR e gastrectomia.
João Soares, Pedro Bastos
Serviço de Gastrenterologia, Hospital de Braga